Na verdade, eu penso na morte o tempo todo. Acho cômico quando alguém diz “se eu morrer...”, assim, usando o “se”, como se houvesse alternativa. Parece que as pessoas acreditam que se disserem “quando eu morrer...”, a morte vai se aproximar delas, simplesmente por elas terem admitido que são mortais. Simplesmente por terem permitido pensar que podem morrer. Como se morrer dependesse de nós...
Eu penso muito em morrer, e isso não quer dizer que eu seja melancólica, ou depressiva. A morte é um prazo, e quero ter certeza de que fiz os deveres antes do prazo chegar. Todos nós vamos morrer, eventualmente, e é preciso se certificar de que “quando” ela chegar, não haverá excessivos arrependimentos para amargar ainda mais a ocasião.
Mas como eu disse no início, quando uma viagem longa e, principalmente, que inclua trechos aéreos se aproxima, eu intensifico o pensamento na morte. Tenho medo de voar, muito medo, porém, ele não é mais forte que a vontade que eu tenho de viajar. Por isso, continuo viajando. Mas tenho muito medo de acidentes aéreos, e na possibilidade de estar em um deles.
Nessas épocas do ano, nas semanas que antecedem uma viagem, eu começo a me despedir mentalmente das pessoas, dos lugares, das coisas... Sim, eu penso que aquela pode ser a última vez que tomarei um chimarrão ao sol da tarde no sofá da minha sala, que aquele pode ser o último afago que dou no meu gato enquanto ele aperta seus olhinhos, que aquele abraço na minha mãe pode ser o último.
Mas como diz o título, pensar na morte com tanta intensidade pode ser bom. A despedida mental das coisas antes de viajar só faz com que o reencontro com elas seja ainda mais intenso e feliz. É muito bom abraçar minha mãe no retorno de uma viagem, com histórias pra contar. Tomar um chimarrão na sala depois de desfazer as malas, então, é uma das melhores sensações do mundo! Afagar meu gato, que está excepcionalmente carinhoso comigo porque sentiu minha falta, é algo tão reconfortante...
Certa vez, a escritora Margaret Atwood disse: “I no longer feel I'll be dead by thirty; now it's sixty. I suppose these deadlines we set for ourselves are really a way of saying we appreciate time, and want to use all of it”.
“Eu não sinto mais que estarei morta aos trinta, agora é sessenta. Penso que esses prazos que definimos para nós mesmos sejam, na verdade, uma maneira de dizer que apreciamos o tempo, e queremos usá-lo por inteiro”.
Atwood sabe como é viver com prazos mentais. Não é assustador, nem sintoma de patologia, é uma maneira sensata de estar ciente da sua mortalidade e saber exatamente o que se quer fazer antes que ela chegue. Porque, meu caro, ela vai chegar.
Atwood está com 75 anos, e continua escrevendo. Recentemente, eu fiz 30 e estou indo pra mais um país da minha lista...
Que venham os próximos prazos!