Ana Raspini é viajante, além de professora de Inglês, e escritora.

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Brasileira, professora de Inglês, escritora, mas acima de tudo, viajante.

sexta-feira, 5 de março de 2021

Imigrante

Sair do país é sair-se de si

Olhar para dentro por outro ângulo

Como a alma observa o corpo a dormir

De acordo com aqueles que acreditam em almas.

O formato das tomadas, as portas e janelas

Novas regras sociais

O sabor da água, da sobremesa...

Sua consciência vira imigrante no seu corpo

Seu corpo é imigrante naquele clima

A mercê das doenças de pele

Que o frio marca como se fosse ferro em brasa.

A mercê dos pães e das carnes

E os dentes que se vão com eles.

Você substitui preocupações como roubo e estupro

Pela preocupação com a cal

Ou com os animais que roem os cabos do seu carro

O que pode ser igualmente letal, dependendo do cabo.

Sair do país é descobrir que a gestação de uma amizade

É a mais longa do reino animal

É um curso intensivo nos defeitos dos outros,

Mais os seus, mais as dificuldades circunstanciais.

Sair do país é dar um novo sentido à solidão

O sentido mais completo

Não reconhecer e nunca ser reconhecido

Tornar-se invisível na multidão, no trabalho, no bairro

Passar dias sem proferir um som familiar,

Dias sem ouvir um som familiar.

Expandir-se a vários continentes traz o gozo, a dor

E o discernimento de que não há volta para o ninho.


Vilsalpsee, Austria


terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Como sabemos se o processo de imigração foi concluído com sucesso?

Dia 12/12/2017, hoje faz um ano que chegamos na Alemanha para morar. Apesar de já conhecer o país antes, pois já era casada com um alemão há 6 anos naquela data, cheguei cheia de sonhos e ilusões. Lembro vivamente de achar até o céu naquele dezembro cinza tão lindo que valia uma foto. Fiz a foto, logo depois fui descobrir que comprar uma cozinha custaria os olhos da cara e que não poderíamos financiá-la, como anunciado no site da empresa, pois meu esposo ainda não tinha 6 meses no emprego (na data, ele não tinha nem um dia, apenas o contrato). A cozinha era uma das pouquíssimas coisas que poderia ser financiada aqui. Ali nos demos conta dos espinhos com os quais não contávamos pelo caminho.
   Àquela experiência seguiram-se outras, tão ruins quanto, senão piores. Enquanto eu não comprovasse o nível A1 de alemão (o qual eu havia estudado já no Brasil, mas do qual eu não tinha um certificado de um órgão oficial, como o Goethe Institute, por exemplo), eu não ganharia ajuda de custo do governo para fazer o A2, e não me dariam um visto de permanência, mesmo sendo casada com cidadão da UE. Porém, eu não queria ficar sentada esperando a prova do A1 chegar. Me inscrevi no curso do A2 pagando valor integral. Acontece que sem visto, eu não poderia trabalhar, apenas estudar.
Imagine estar desempregada, pagando caro para estudar, enquanto precisa mobiliar uma casa do zero. Quer mais? Imagine nesse cenário, você receber uma multa de alguns milhares de euros por download ilegal. Erro nosso, obviamente, pois devíamos ter nos informados sobre as leis a respeito, antes de eu baixar alguns seriados para ver naquele muito tempo que eu tinha livre nas mãos. Pois é. A vida acontece. Nunca me senti tão triste como naquela ocasião. Costumo dizer que aquele foi o meu momento “Bem vinda à Alemanha”. Contratamos um advogado para nos livrar da multa, pois o advogado custaria menos que a mesma, e seguimos o baile.
   Sim, viemos pois meu esposo havia recebido uma proposta de emprego aqui, e a renda dele era, sim, algo com que podíamos contar. Porém, pagando pelo meu curso e transporte, pagando aluguel e todas as outras coisas necessárias a uma casa, sobrava muito pouco para móveis. Fiz uma lista de móveis mais prioritários, e compramos quase todos usados pela internet, uma dádiva deste país. Alguns móveis que eu encontrava muito baratos na internet, mas que não eram prioritários, tive a brilhante ideia de fazer um “uso duplo”. Nossa escrivaninha de hoje foi, por muito tempo, mesa de jantar. A estante de livros foi, por ainda mais tempo, nosso guarda-roupas.
Finalmente o resultado positivo da prova do A1 chegou e o governo pagou pelo meu curso de B1. Depois de alguns documentos perdidos (!!!) pela secretaria de imigração, depois de muitas entrevistas e de algumas taxas, em abril de 2017 meu visto chegou e pude trabalhar. Trabalho aqui não falta, e eu já tinha uma vaga garantida como professora de inglês numa escola de idiomas desde antes mesmo de meu visto chegar. Estudar 20hs e trabalhar outras 20hs em algo que realmente amo me fez sentir bem mais viva e útil.
Em maio comecei outro processo que viria a se tornar a maior dor de cabeça de todas: a temida carteira de motorista alemã. Valores altíssimos, mais de 1000 questões teóricas para memorizar, instrutor rude que passava todas as aulas drenando até a última gota de auto-estima e motivação que eu tinha. Para ele, tudo que eu fazia ao volante era errado, tudo era reflexo do péssimo trânsito brasileiro. Na primeira prova teórica, falhei. De novo, aquele sentimento de não-adequação tomava conta de mim. Aquele foi meu momento “Este país não é para amadores, e você é uma mera amadora”. Mais estudo, mais aulas, mais dinheiro investido, um total de 3 meses e 1.500 euros gastei nesse processo. Finalmente, fui aprovada na prova teórica. Uma semana depois, fui aprovada na prova prática de primeira. Mais um mês depois, chega o certificado do B1 com boas notas.
Quando você olha pra trás para estas conquistas, você pode achar que me sinto como se tivesse alcançado muito. Mas não. Mesmo depois de tudo isso, nada me tira da mente a certeza de que um imigrante só está totalmente adaptado ao novo país quando você consegue explicar ao cabeleireiro que corte quer, ao dentista o que aconteceu, e ao médico os sintomas que sente.
Hoje eu fui ao cabeleireiro sozinha pela primeira vez e, mesmo com meu alemão quebrado, o corte saiu mais parecido com o que eu queria do que nas outras duas vezes em que fui com meu esposo ou uma amiga como tradutores. Em um ano eu só havia ido ao cabeleireiro duas vezes, por medo. No Brasil, em um ano, eu teria ido ao cabeleireiro seis vezes.
    Já precisei ir ao dentista sozinha, um que não falava inglês, mas como ele falou muito mais do que eu sobre o que precisava ser feito, saí com a auto-estima quase ilesa. Quando eu não entendia uma palavra, ele tinha paciência suficiente para mostrar numa boca de gesso sobre o que ele estava falando. Não foi uma conversa satisfatória, mas creio que nos entendemos.
       Porém, até hoje só fui ao médico acompanhada, ou exijo que me coloquem com a médica que sei que fala inglês. Não tenho, absolutamente, vocabulário em alemão para explicar sintomas, efeitos colaterais e afins. Um ano aqui não foi suficiente para tal. Me pergunto quanto tempo precisarei para isso.
   Por isso, para mim, isso é o que significa concluir felizmente a adaptação ao novo país: conseguir se virar em qualquer situação, seja ela qual for, emergencial ou não, na língua local, sem ajuda.

    Lembro com orgulho de quando comprar uma simples passagem de ônibus com o motorista era um pesadelo, e que hoje isso faz parte do meu cotidiano. Hoje mesmo, tive minha primeira conversa “fiada” na parada do ônibus com outros passageiros. Hoje, o pesadelo do cabeleireiro foi exorcizado com sucesso. Quando o pesadelo do médico e do dentista também serão? Um medo de cada vez.


quinta-feira, 30 de novembro de 2017

O que aprendi sobre cerveja com os alemães

Primeiramente, devo avisar que sou casada com um alemão, bávaro, que, dada sua paixão pela cerveja, acabou por aprender sobre o processo e fazer cerveja artesanalmente nos últimos meses em que moramos no Brasil. Mas creio que posso dizer que todo bávaro é um apreciador e conhecedor de cerveja, independente da idade ou sexo. Além de casada com um "cervejeiro nato" por 7 anos, estou morando na Alemanha há um ano, onde tenho intensificado meu conhecimento e apreciação por esse alimento. Sim, na Alemanha, a cerveja é, de fato, considerada alimento. Beber uma ou até duas cervejas por dia, todo dia, não é considerado algo negativo, muito menos alcoolismo, como meu pai teima em julgar.

Porém, este alimento tão nobre vem com suas regras de conduta. Algo que brasileiros acostumados a tomar Skol, à base de milho, sem colarinho e quase congelada, devem aprender. Eu aprendi e compartilho aqui as boas maneiras do consumo de cerveja na Alemanha.

1. Brinde!

Nenhuma gota de bebida alcoólica deve ser consumida sem que se brinde com seus amigos e convidados. A menos que você esteja sozinho, você deve sempre brindar olhando cada pessoa nos olhos. Reza a lenda que brindar sem olhar nos olhos traz a maldição de 7 anos de sexo ruim! Vai arriscar?




2. Espuma é bom

Ao servir sua cerveja, que na Alemanha consiste em uma garrafa de 500ml em um copo de 500ml, você deve deixar que ela faça um pouco de espuma. Permitir que o CO2 se dissolva com a espuma não só irá te permitir beber mais, pois seu estômago não vai inflar tanto quando com uma cerveja cheia de CO2, como também vai proteger a cerveja, mantendo seu gás e sua temperatura.






3. 12 graus é o ideal

De acordo com Klaus Bischoff, guia da Cervejaria Ayinger, a temperatura ideal para o consumo da cerveja é 12 graus. Isso é quase inconcebível para brasileiros por conta da qualidade da cerveja brasileira. Eu sei que é impossível beber uma Skol, Brahma ou Kaiser a 12 graus. É literalmente intragável! Porém, uma cerveja alemã, obrigatoriamente fiel à lei alemã da pureza (Reinheitsgebot), pode ser degustada diretamente da porta da geladeira ou até mesmo saída do porão.




4. A melhor marca é sempre a local

Na Alemanha, não importa se uma marca é famosa, o que importa é ela ser local. Na Alemanha, por exemplo, você não encontra as famosas cervejas trapistas belgas no mercado, porque elas não são locais. Nem mesmo a Weihenstephan, cervejaria alemã que é considerada a mais antiga do mundo, é vendida em outras regiões que não a sua. Conhecer cervejas é o ponto alto do turismo dentro da Alemanha. Os alemães viajam muito dentro da Alemanha, e além da arte, cultura e belezas naturais, as cervejas locais fazem parte da experiência.




Agora vá lá ver seus amigos, abra uma (ou mais) cerveja(s), olhe nos olhos, brinde e seja feliz!

Prost!

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Rep. Dominicana: Praias, Policiais e Parasitas (não necessariamente nesta ordem)

Foram necessários alguns meses para que eu conseguisse escrever sobre o que passei na República Dominicana. E assim como testemunhos maravilhosos de amigos que haviam visitado o país me fizeram, de certa forma, "baixar a guarda" e pagar um alto preço por isso, eu não quero que minha experiência ruim faça alguém desistir de visitar esse país. Apenas vá preparado.

Ainda tenho sentimentos conflitantes sobre a experiência...

Havíamos sido alertados sobre o "hábito" dos policiais dominicanos em pedir "propina" aos turistas. Porém, o conselho que tirei dessas informações foi a precaução de deixar na carteira apenas uma parte do dinheiro que tínhamos, e esconder o resto (em diferentes lugares, caso fosse necessário mostrar mais).

O problema é que imaginávamos policiais que, sabendo da ilegalidade do que pediam, o fizessem calmamente, na sordina. Mas não. Após pegar o carro alugado no aeroporto, nos primeiros metros que dirigimos no centro de Santo Domingo, já fomos parados por um policial. Este meliante disse que havíamos passado um sinal vermelho (num local onde nem semáforo havia), e exigiu o passaporte e carteira de motorista do meu esposo, que dirigia o carro. E foi então que o pesadelo começou. Com os doocumentos em mãos, ele começou a nos torturar. Ele gritava, fazia ameaças de que teríamos que ir à delegacia, pagar uma multa altíssima e talvez fôssemos presos. Disse ainda que precisaríamos contratar um advogado especializado em estrangeiros. Ele estava tão agressivo, que nós, de fato, acreditamos que poderíamos ser presos. Dissemos a  ele que iriamos à delegacia. Mas então tudo ficou ainda mais estranho. Ele deixou o colega dele com a viatura, e estrou no nosso carro para nos levar à delegacia! Minha mãe estava no banco de trás e temeu pela sua integridade física, por havia um homem estranho ao seu lado.

Ele nos mandou dirigir por uma rua, e fomos. A rua era mais calma, e foi então que ele começou a negociar. Para nos assustar, disse que além do advogado, teriamos que fazer um curso, que levaria um dia todo, sobre como dirigir no país. Por favor, imaginem que a Republica Dominicana tem o transito da Índia, apenas com um pouco menos motocicletas. Foi então que ele disse o valor da multa: 17 mil pesos. Isso dá 360 dólares! Dissemos que não poderíamos pagar e que conversaríamos com o delegado sobre isso. A cada esquina "a caminho da delegacia" ele dava novas informações, sobre quanto perderiamos com o curso e o advogado. Quando ele disse que poderia receber uma quantia inferior à multa mencionada antes, foi que entendemos que estávamos sendo extorquidos, porém, por um profissional. Chegamos a um valor abaixo da multa, mas ainda bem salgado. Como eu havia tirado um pouco de dinheiro da minha carteira, e o resto estava escondido nas malas, precisei pedir a minha mãe que me desse dinheiro. Quando ele viu mais dinheiro na carteira dela, quis mais. Eu gritei com ele e disse que se pegasse tudo, não teriamos o que comer. Foi então que ele, de mal grado, pegou os 150 dolares (que fique claro que isso era 1/4 do que tíanhmos para toda a viagem), jogou os documentos do meu esposo no colo dele e saiu do carro.

Ao chegar no hotel e contar nossa história ao recepcionista, ele disse que o procedimento nesses casos é fazer um video ou foto do criminoso e ameaçar enviar por twitter ao chefe de polícia do país. Para nós já era tarde, mas talvez pra você não seja.

Eu nunca havia temido pela minha integridade física antes, nem no meu próprio país, nem em outro. E naquela viagem eu me sentia responsável pela integridade da minha mãe também. Era a primeira vez que ela saia do país. Foi um medo que me faz limitar para quais países eu viajo hoje em dia.

As praias? São realmente lindas, mas eles permitem que cães passeiem por elas. E foi assim que voltei pro Brasil com um trauma e um parasita no pé. Cães na praia transmitem parasitas como o Bicho Geográfico. O tratamento não foi legal.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Intercâmbio depois dos 30: Vantagens e desvantagens

Eu sempre quis morar fora do país por um tempo, isso sempre esteve nos meus planos. E eu sempre quis ficar pelo menos um ano, para ver todas as estações e todas as celebrações daquele país.

Quando eu era adolescente, o plano era pegar um avião pra Londres assim que terminasse a graduação. Acho que Londres é o sonho de qualquer professor de Inglês.

Mas a vida, meu amigo...

Só consegui visitar Londres aos 27 anos, no meio do Mestrado, e digamos que a cidade não era como eu esperava. Era inverno e o clima foi uma desgraça, choveu em cada um dos 7 dias que passei lá. As pessoas estavam mau-humoradas, a comida era pesada e a cerveja sem gás. Depois da viagem de Londres, "aprendi a não carregar expectativas na mala. Pesam muito".

A vida tomou seus rumos próprios e se contassem pra Ana de 14 anos que ela casaria com um alemão, ela daria risada. Casei com um alemão e moramos no Brasil durante 7 anos antes de tomar a decisão de vir pra Alemanha.

Então, eis que aos 31 anos me vejo morando num país cujo idioma eu não falo, estudando diariamente para compreendê-lo. Como ainda não posso comprovar o nível A1 (um exame que farei em breve), não posso trabalhar, são as regras do país. Voltei a ser apenas estudante, aos 31 anos.

Noto diariamente as vantagens de, finalmente, realizar o sonho do intercâmbio, mas também noto as desvantagens. Vamos a elas:

AS DESVANTAGENS estão na idade, no 'aluguel' do corpinho que fica cada dia mais caro. Depois dos 30 a gente já carrega umas burocracias com a saúde que não carregava 10 anos antes: É uma enxaqueca que você acompanha com o neurologista da sua cidade, um nódulo no seio que você precisa verificar anualmente, uma dor chata nas costas que só passa com aquele relaxante muscular que só vende no Brasil. Aliás, taí outro grande problema, a maioria dos países europeus não permite a venda de quase nenhum medicamento sem receita médica. Isso complica bastante a vida da gente que já estava habituado com relaxante muscular, anti-inflamatório, etc. Passei um mês com dor nas costas depois que cheguei porque ajudei o esposo a subir uma cama box, um sofá de 3 lugares e mais uma dezena de coisas dois andares acima. A Ana de 22 anos teria se recuperado bem mais rápido desse tipo de esforço físico.

AS VANTAGENS são, na minha opinião, a realização do sonho em si, mais esse degrau galgado na sua história de vida. E realizar esse sonho com maturidade tem vários benefícios.

Maturidade para ter calma nas horas difíceis faz toda a diferença. A Ana de 22 anos que planejava morar fora teria morrido de ansiedade a cada vez que não compreendesse o que alguém disse. Em contrapartida, a Ana de 31 desencana, ela apenas sorri e diz: "Entschuldigung, ich spreche kein Deutsch" (Desculpe, eu não falo alemão).

Outro exemplo: Estamos sem cozinha há um mês e meio (já mencionei isso aqui), lavamos a louça no banheiro, e se não lavarmos as duas facas e dois garfos que temos a cada uso, ficamos sem. Dez anos atrás, essa situação me daria comichão por conta da ansiedade e frustração. Hoje não. Eu realmente não me importo mais. Agora eu foco na 'imagem maior', em tudo que isso representa, e não nos detalhes que poderiam me enfurecer.


A maturidade também vem com a capacidade de contemplar o que há ao redor, observar as pessoas, aprender com elas. Maturidade traz humildade para aceitar a cultura do outro, sem perder de vista a própria identidade.

Essa mensagem abaixo chegou em mim tarde demais, mas eu ratifico cada linha: "Viaje enquanto for jovem e capaz. Não se preocupe com dinheiro, apenas faça dar certo. A experiência é infinitamente mais valiosa do que o dinheiro jamais será."

Se ainda não tiver passado dos 30: VÁ MORAR FORA!
Se já tiver passado dos 30: VÁ, mas leve os remédios consigo. ;)

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Um novo país, um novo personagem

Uma amiga (oi, Veruska!) me marcou hoje nesse texto aqui, do Felipe Pacheco. Um texto um tanto dramático sobre como sair do país é, de certa dorma, morrer. No texto ele conta que está morando no Canadá há um mês, e eu rio da coincidência, pois estou na Alemanha há um mês também.

Não concordo com algumas coisas que ele diz, como a comparação do bota-fora a um velório, ou da despedida no aeroporto ser como um enterro. Minha partida não foi triste como um velório ou um enterro, meus familiares e amigos sabiam que eu estava indo realizar um sonho de longa data e estavam felizes por mim. Teve choro na despedida, claro! Mas teve sorriso, teve "até logo". Teve "boa sorte" e teve "nos vemos em setembro". Teve alguns "te amo" meio atrasados, mas isso é só um nó a menos pra carregar na garganta depois.

Sobre se redescobrir, se reiventar, eu já tentava fazer isso todo dia. Não sou escritora, uma vez que não recebo para tal, mas escrevo todos os dias da minha vida, e quem escreve olha muito pra dentro. Porque olhar pra dentro é se questionar, se negar e se aceitar. Refletir sobre si para poder escrever sobre o humano e sobre o mundo te obriga a te virar do avesso. Eu nunca acreditei que eu era o meu emprego, o meu carro ou o meu pequeno apartamento, como ele diz. É óbvio que eu não sou a minha rotina. Nem nunca permiti que minha rotina definisse quem eu sou.

Mas eu confesso que concordo plenamente quando ele fala em se reinventar. Num novo ambiente, você também adota o novo para si, e eu acho que essa parte do "novo papel" é a melhor. Sair do seu país e começar uma nova vida em outro é como ganhar uma tela em branco, de certa forma. A gente preenche ela como quer, dentro das oportunidades oferecidas, claro. Mas tanto a tela, quanto as oportunidades são diferentes, por isso, a imagem final, o papel a ser representado, será diferente.

A cada "morte" do papel antigo, a cada novo papel, existe a chance de fazer melhor que antes. Se preocupar menos, se permitir mais, ser mais (ou menos) saudável, confiante, espontâneo... A tela em branco é linda e assustadora ao mesmo tempo. Estou vivendo as delícias e medos da tela completamente em branco pela primeira vez, mas já acho que todo mundo devia passar por isso um dia, é libertador.

P.s.: Na foto abaixo, uma das muitas maneiras que eu me reinvento todo dia: Estamos morando num apartamento sem cozinha. Encomendamos uma, porém, o tempo de espera é de 2 meses. Mas como é inverno, os itens que iriam para a geladeira ficam assim, na sacada.


quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Um chaveiro e uma saudade

Há alguns anos - 5 ou 6, não sei precisar - meus pais me deram um chaveiro de presente. Eles haviam ido visitar Piratuba, em Santa Catarina, região famosa por suas águas termais e suas pedras. O chaveiro era de uma pedra amarronzada e tinha o formato do Brasil.

Na época, deixei o presente de lado, eu já tinha um chaveiro: um que uma amiga tinha trazido de Londres pra mim. Lá no Brasil, um chaveiro do Brasil não tinha serventia.

Agora, alguns anos mais tarde e 11 mil quilômetros distante do Brasil e dos meus pais, coloquei as chaves da minha nova casa européia naquele chaveiro de pedra. Agora ele tem um significado.

Acho que é isso que os pais fazem, nos fornecem coisas - seja um casaco, seja um conselho - que só farão sentido mais tarde.